
O atacante Rony, atleta profissional de futebol vinculado contratualmente ao Clube Atlético Mineiro, retirou ação trabalhista que havia ajuizado na Justiça do Trabalho de Minas Gerais com pedido de rescisão indireta do contrato de trabalho, em razão de atrasos reiterados no pagamento de verbas contratuais — notadamente FGTS, luvas e direito de imagem. A desistência do feito ocorreu após celebração de acordo extrajudicial entre o clube e o jogador.
A rescisão indireta do contrato de trabalho é um mecanismo jurídico previsto tanto na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) quanto na Lei Geral do Esporte (Lei nº 14.597/2023), aplicável ao trabalhador, inclusive o atleta profissional, que deseja encerrar o vínculo empregatício diante do descumprimento grave das obrigações contratuais por parte do empregador.
Trata-se de uma forma de rescisão ao qual reconhece que a conduta do empregador torna insustentável a continuidade da relação de trabalho, autorizando o empregado a se desligar do vínculo com todos os direitos rescisórios que lhe seriam devidos em caso de dispensa sem justa causa.
Pelo ordenamento geral da CLT, o instituto encontra previsão expressa no art. 483, alínea “d”, que dispõe que o empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização “quando o empregador não cumprir as obrigações do contrato”.
O descumprimento pode se dar, por exemplo, pelo atraso reiterado de salários, pela falta de recolhimento do FGTS, não pagamento de verbas contratuais, ou mesmo por qualquer outro comportamento patronal que importe violação aos deveres contratuais essenciais.
No caso específico do atleta profissional de futebol — e dos demais trabalhadores do esporte —, a Lei Geral do Esporte trouxe disciplina específica à matéria. O art. 90, §1º, da Lei nº 14.597/2023, estabelecendo de maneira clara que o atleta poderá considerar rescindido o contrato especial de trabalho desportivo “quando o empregador ou a entidade de prática desportiva deixar de cumprir as cláusulas pactuadas”, assegurando, inclusive, o pagamento de multa compensatória nos termos do próprio contrato.
No caso do atleta, essa proteção é ainda mais relevante diante da natureza singular da profissão e da curta duração média dos contratos, que exigem previsibilidade financeira e segurança jurídica para o exercício regular da atividade esportiva.
Ademais, a despeito da referida temática, tem-se que o Tribunal Superior do Trabalho (TST) reafirmou sua jurisprudência pacífica sobre a matéria por meio de recente emissão de teses vinculante, na qual estabeleceu-se expressamente a possibilidade de rescisão indireta do contrato de trabalho em razão da irregularidade no recolhimento dos depósitos do FGTS, conforme registrado em acórdão proferido no processo RRAg-1000063-90.2024.5.02.0032. Vejamos:
“A irregularidade no recolhimento dos depósitos de FGTS revela descumprimento de obrigação contratual, nos termos do art. 483, “d”, da CLT, de gravidade suficiente para configurar a rescisão indireta do contrato de trabalho, sendo desnecessária a imediatidade na reação do empregado ao descumprimento contratual.” (Processo: RRAg-1000063- 90.2024.5.02.0032)
No entanto, e conforme novas informações divulgadas pela diretoria do Atlético-MG, a ação ajuizada por Rony foi “retirada” após ajuste direto entre o clube, o atleta e seu staff, sem necessidade de homologação judicial, resultando na manutenção do vínculo contratual em vigor, o que indica a renúncia do jogador ao processo judicial. O coordenador de futebol do clube, Paulo Bracks, declarou à imprensa que “não há mais qualquer demanda trabalhista ativa em desfavor do Atlético a partir de quarta-feira”, e que a resolução foi obtida de maneira respeitosa e consensual.
Ainda segundo informações apuradas, a desistência da ação se deu no contexto de reuniões entre representantes do clube, comissão técnica e investidores da SAF (Sociedade Anônima do Futebol), com o intuito de sanar as pendências salariais junto ao elenco, incluindo a regularização de parcelas de FGTS e direitos de imagem.
Assim sendo, tem-se que a situação em tela evidencia a relevância do cumprimento rigoroso das obrigações trabalhistas em contratos especiais de trabalho, como o dos atletas profissionais de futebol, que possuem legislação própria (Lei nº 9.615/1998 – Lei Pelé), mas são também regidos, subsidiariamente, pela CLT.
Por fim, a situação serve como alerta para os clubes de futebol no que tange à regularidade dos pagamentos contratuais e o risco jurídico que decorre da inobservância de obrigações básicas, como salários, premiações e contribuições fundiárias, cuja inadimplência reiterada pode culminar em ruptura unilateral do vínculo com ônus exclusivo ao empregador.
Referência:
Link da notícia
Artigo por Felipe de Barros – OAB/SP 518.359